Os amores platônicos de Carolina Santa Rosa

segunda-feira, 29 de outubro de 2012



    Carolina Santa Rosa apaixonou-se pela primeira vez aos sete anos, numa quente tarde de sábado. Era seu aniversário. De presente, recebera um coelhinho branco, macio. E assim, nesse simples gesto, iniciou-se uma série de infortúnios na existência da menina.
    Carolina encantou-se pelo coelho. Deixou as bonecas, os brinquedos. Só tinha olhos para ele. Alimentava-o com carinho, limpava a gaiola diariamente. Doava-se para o animal de modo pleno. Apaixonado. Entretanto, esses bichinhos delicados não duram muito. Morreu de alguma misteriosa doença, excesso de zelo, talvez.
    Ao contrário do que os familiares esperavam, Carolina recuperou-se rápido da sua dor. Mas ainda demorou um pouco para entregar-se a sentimentos intensos novamente. Sua segunda paixão aconteceu aos dez anos, por um garoto mais velho. Suspirava pelos cantos, olhava-o à distância. Nunca trocou uma palavra com ele, porém, os vários diálogos que criava mentalmente alimentavam seu amor. Esse amor, como era de ser, mostrou-se ilusório. Quando o garoto mudou-se de cidade, ela o esqueceu.
    A partir daí, suas paixões debandaram-se. Aos treze, apaixonou-se duas vezes: por Sílvio, um menino da sua turma, e em seguida por Lázaro, um tio do interior. Em nenhum dos casos houve reciprocidade.
    Ela, então, sofreu uma depressão profunda. Sentia-se inferior aos outros. Por que ninguém lhe amava? Seria tão feia assim? Não, não é, os pais diziam-lhe, levando-a a psicólogos, terapeutas. Essa fase só passou aos quinze anos, quando apaixonou-se novamente e deu seu primeiro beijo. O rapaz, contudo, logo a trocou por outra. A depressão voltou com força total.
    Na faculdade, pensou que enfim tinha encontrado o amor de sua vida. Chegou a noivar. Eduardo era um ex-estudante de filosofia que trancara a faculdade para tornar-se guarda de trânsito. Bom moço, todos diziam. O namoro durou três anos; o noivado, dois. Um mês antes do casamento, ele enforcou-se, no quarto. O motivo do suicídio, nunca se soube. Jogo do bicho, todos diziam.
    Carolina entrou em luto fechado. Despediu-se do emprego; ficava somente em casa, fumando ou chorando. Os amigos, de início, tentaram ajudá-la. Desistiram com o passar do tempo. Ela só acordou da letargia quando um dia olhou-se no espelho. Parecia tão velha, a despeito dos seus vinte e seis anos. Resolveu reagir e procurou algum trabalho.
    Não foi uma busca difícil. Era moça inteligente. Empregou-se na firma dos irmãos Truchetti, como administradora. Ao conhecer o novo chefe, apaixonou-se. Mesmo ele sendo casado, começaram um caso que estendeu-se por anos. Faziam amor no escritório e encontravam-se furtivamente nas sextas. Mas não eram suficientemente discretos. A esposa dele descobriu manchas, arranhões, contas dispendiosas... O matou numa agradável manhã de inverno.
    Estranhamente, Carolina não ficou muito triste por ele. Aos trinta e um anos, não mais se impressionava com as tramas do seu destino. Recomeçou a fumar, por nervosismo. Agora andava sempre nervosa.
    Um novo homem surgiu na vida dela. Dessa vez, sem amor. Somente sexo. Um jovem bonito, de dezessete anos. Gosto de mulheres mais velhas, dizia, beijando-lhe a carne. Possuía fetiches estranhos, envolvendo animais e até a avó. Breve, o abandonou.
    Muitos outros amores apareceram. Efêmeros, cada vez mais efêmeros. Quando fez quarenta e dois anos, foi promovida na firma. Porém isso não lhe trouxe nenhuma satisfação. Vivia mecanicamente, amava mecanicamente. Foi assim que viveu até seu atual namorado encontrá-la na cama, morta, com uma garafa de uísque ao lado. Câncer não tratado no pulmão. Causado, obviamente, por sua única paixão correspondida: o cigarro.

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